A mentira “suja” sobre o gás limpo

Factos básicos sobre o fracking

A fraturação hidráulica, também chamado de fracking, é uma técnica moderna para se retirar gás natural do solo. O presidente Obama fala da “queima limpa” do gás natural. Alguns especialistas afirmam que os EUA podem, através do fracking, extrair gás suficiente para abastecer nossa nação, tão ávida por energia, pelos próximos 100 anos. Entretanto, há um lado sombrio nesta história.

  • Muitos dos 500.000 poços de petróleo e gás dos EUA recorrem ao Cada poço de fracking consome 400 caminhões grandes de água por dia, tensionando as já escassas fontes de água de regiões áridas.
  • A água é misturada a mais de 300 produtos químicos perigosos e areia, e então é injetada no o subsolo. Quando retorna com petróleo e gás, os rejeitos formam reservatórios tóxicos. Dali podem poluir o solo, o ar e a água e causar câncer e outras doenças em seres humanos, animais e plantas.
  • Poços de fracking liberam metano na atmosfera, que é um forte gás-estufa. Portanto, o gás natural proveniente do fracking talvez gere ainda mais mudanças climáticas que o carvão.
  • O fracking pode causar terremotos.
  • Muitos poços de fracking esgotar-se-ão em poucos anos. Assim, as perfurações devem continuar em ritmo frenético para manter os níveis de produção, e a estimativa de suprimento para mais 100 anos provavelmente é muito exagerada.
  • Se os enormes investimentos em fracking tivessem sido usados para construir usinas eólicas e painéis solares, estaríamos muito à frente no caminho de uma economia verde e de uma produção que não destrua a natureza e os seres humanos.

A miragem dos EUA como a nova Arábia Saudita do petróleo e gás

A Agência de Informações de Energia dos EUA espera que em 2013 os EUA se tornem o maior produtor mundial de petróleo e gás natural. O conteúdo energético de ambos os combustíveis equivalerá a 25 milhões de barris de petróleo por dia. Em apenas 5 anos, a produção norte-americana aumentou mais de 30%.

O motivo é a rápida expansão da extração de petróleo e gás de xisto pelo uso da “fraturação hidráulica”, técnica conhecida como fracking. Alguns “especialistas” em energia falam dos EUA como a nova Arábia Saudita da produção de energia.

http://www.eia.gov/todayinenergy/detail.cfm?id=13251

Veja o que a agência ambiental dos EUA (EPA) diz a respeito:

O gás natural tem um papel chave no futuro da energia limpa em nossa nação. Os EUA têm vastas reservas de gás natural que são comercialmente viáveis graças aos avanços nas tecnologias de perfuração horizontal e de fraturação hidráulica, permitindo maior acesso ao gás em formações xistosas. O desenvolvimento responsável dos recursos americanos de gás de xisto oferece uma importante segurança econômica e energética, e benefícios ambientais.

http://www2.epa.gov/hydraulicfracturing

Isso parece bom, mas o que é “fracking“?

Há duas definições de fracking no dicionário urbano online:

  1. Um novo meio de se extrair petróleo de depósitos de gás de xisto por meio de fraturação hidráulica.
  2. Um substituto educado para “foda”.

O outro lado do fracking

Muitos habitantes dos arredores dos poços de fracking nos EUA acha esse crescimento do “gás natural” um desastre. Nos filmes Gasland e Gasland 2, Josh Fox nos informa dos efeitos devastadores do fracking. Numa cena famosa, ele mostra como a “água” da torneira de sua casa pega fogo, por estar contaminada com gás natural.

Então, o que pensas?

A origem do petróleo e do gás natural

O carvão, o petróleo e o gás natural são combustíveis fósseis. Eles vêm de plantas e organismos que viveram há milhões de anos. Movimentos geológicos os empurraram para o subsolo. Com a temperatura e pressão certas, a biomassa soterrada se transforma em carvão, petróleo ou gás.

Se a biomassa for levada mais de 2500 metros terra abaixo, um processo chamado craqueamento a transformará em petróleo. Quando esse material chega a mais de 5000 metros, o craqueamento o decomporá em gás natural.

Como o petróleo e o gás são mais leves que as rochas subterrâneas, eles ficam “tentando” mover-se para cima. Mas muito fica preso, difuso em quantidades tão pequenas que não é viável extrair estes combustíveis fósseis para o consumo. O que interessa as companhias petrolíferas, obviamente, são o petróleo e o gás economicamente viáveis.

Se a rocha for porosa e tiver fissuras, o petróleo pode subir, em alguns casos até atingir a superfície, como no Canadá, onde existem grandes áreas de areia betuminosa. Neste caso, por seu estado físico, o gás vaza lentamente para a atmosfera.

Entretanto, frequentemente petróleo e gás, em seu caminho até a superfície, encontram uma camada rochosa, chamada de rocha de cobertura, que os impede de ascender, formando assim um depósito subterrâneo.

Um depósito grande é o sonho das petrolíferas. Sob o Golfo Pérsico encontram-se os maiores depósitos de petróleo e gás, porque aquela área tem uma sólida camada de rocha de cobertura. É por isso que as guerras por petróleo aconteceram no Irã, Kuwait e Iraque.

Uma breve história da produção de petróleo

A moderna extração de petróleo começou 150 anos atrás na Pensilvânia, EUA, quando Edwin Drake perfurou e encontrou um petróleo que podia ser usado comercialmente. Em breve haveria muitos outros perfuradores. O mais famoso era Nelson Rockefeller. Ele também era dono das ferrovias que transportavam o petróleo. Ele usava tamanho controle para se apropriar da maior parte do petróleo americano, e por volta de 1900 tornou-se o primeiro bilionário do mundo. (Se ajustarmos a inflação, 1 bilhão de dólares em 1900 equivalem a 400 bilhões de dólares atuais). A velha companhia de Rockefeller, a Standard Oil, hoje se chama Exxon. É a companhia multinacional mais lucrativa do mundo.

Antigamente, quando o gás era encontrado junto ao petróleo, não tinha nenhuma utilidade, porque não podia ser transportado. Nos últimos 50 anos, entretanto, o gás natural tornou-se muito valioso, à medida que foram desenvolvidos gasodutos e navios para o transporte de gás natural comprimido.

Por muitos anos, os EUA foram os maiores produtores de petróleo e gás do mundo, mas em 1970 a produção chegou ao apogeu, começou a cair, e a Arábia Saudita e a Rússia tornaram-se os maiores produtores, i.e., até o frenesi do fracking alguns anos atrás.

Como extrair petróleo do solo?

Quando uma perfuratriz de petróleo atinge um depósito grande, a pressão subterrânea expele o petróleo e o gás do solo, mas quando a pressão é insuficiente, o fluxo se interrompe. Neste estágio, ainda resta cerca de 90% do petróleo. Por isso foram desenvolvidas técnicas para se extrair o petróleo restante, tais como injetar água ou ar no poço para aumentar a pressão, aquecer o petróleo no subsolo ou adicionar produtos químicos que deixem o petróleo mais fluido. Com estes métodos, é possível extrair mais de 50% do petróleo.

Uma técnica agressiva utilizada já no século XIX era detonar o poço com dinamite, para fraturar a rocha de modo que o petróleo pudesse fluir pelas fissuras criadas. Mas geralmente este método não rendia muito petróleo.

O que é fraturação hidráulica?

Tradicionalmente, os perfuradores de petróleo procuram petróleo e gás em rochas porosas, como calcário e arenito, por onde o petróleo e o gás podem se aflorar mais facilmente. O xisto é outro tipo de rocha relativamente mole, mas com poucas fissuras. Portanto, o petróleo e o gás nesta rocha ficam muito dispersos, e antigamente eram considerados inviáveis.

Lá pelo ano 2000, algumas companhias petrolíferas começaram a perfurar o xisto em busca de petróleo e gás, usando um novo método.

Primeiro eles perfuram para baixo, até a camada de xisto. De lá, a broca é virada 90o e continua horizontalmente por esta camada, por um km ou mais. De uma mesma plataforma, são cavados 12 buracos na horizontal, cada um em uma direção, como se fosse uma para cada hora do relógio.

Então vem o fracking. Se chama fraturação hidráulica porque utiliza água, enormes quantidades de água bombeadas terra abaixo sob alta pressão. A esta água, adicionam-se areia e um potente coquetel de produtos químicos. A areia funciona como uma lixa, abrindo fissuras na rocha. Os produtos químicos reagem com o petróleo para ajudá-lo a fluir e liberar gás natural. O líquido então é bombeado para cima, agora impregnado de petróleo e gás.

O desenvolvimento do fracking nos EUA

Hoje, os EUA têm 515.000 poços de gás e petróleo. Peritos em energia do ramo do petróleo afirmam que, com o uso da técnica de fracking, há reservas de gás natural para abastecer os EUA pelos próximos 100 anos. O presidente Obama, que não nega o aquecimento global, disse num discurso de agosto de 2013:

Agora, mesmo que estejamos produzindo mais petróleo domesticamente, estamos também queimando mais gás natural, de queima limpa, do que qualquer país na Terra. E mais uma vez, às vezes há dissensos sobre o gás natural, mas devemos fortalecer nossa posição de maior produtor de gás natural para que, pelo menos a médio prazo, ele possa não só prover energia segura e barata, mas também ajudar a reduzir nossas emissões de carbono.

http://www.policymic.com/articles/51131/obama-climate-change-speech-don-t-be-fooled-the-president-just-gave-a-full-throttled-fracking-endorsement

Obama tenta nos dizer que o “gás natural de queima limpa” vai “reduzir nossas emissões de carbono”. As estatísticas oficiais também mostram uma queda das emissões de CO2 dos EUA porque mais energia vem do gás natural. Entretanto, esta estatística é falha por NÃO incluir o vazamento de gás dos poços de fracking. Na realidade, o gás de xisto talvez produza MAIS gases-estufa do que o carvão (retomaremos isto adiante).

A realidade é que os EUA estão perfurando novos poços de fracking em um ritmo frenético.

Em 2000, os EUA tinham 340.000 poços de petróleo e gás. Em 2011, o número tinha aumentado para 515.000. Foi um aumento de 50%. Certas comunidades que receberam intensa atividade de fracking viraram formigueiros de gente, onde homens recém-chegados moram temporariamente em alojamentos, fazem dinheiro rápido e gastam nas noites de sábado em bares e discotecas locais.

O fracking é tóxico

Quando a indústria do petróleo afirma que há pouca poluição no fracking e que não precisamos nos preocupar, está negando os fatos. Para manter a um poço de gás de xisto produzindo são necessários 400 caminhões de água por dia. Esta água é misturada a mais de 300 produtos químicos e bombeada para o subsolo para extrair o gás e o petróleo do solo. Muitos destes produtos químicos são altamente tóxicos. Quando a mistura é bombeada de volta para cima, ela absorveu não apenas petróleo e gás, mas também mercúrio, urânio, chumbo, rádio e outras substâncias tóxicas. Quando o petróleo e o gás são separados e parte da água é reinjetada no poço, a mistura venenosa que sobra é descartada em enormes reservatórios, que continuam crescendo. Por vezes há vazamentos e os venenos se misturam aos rios ou ao lençol freático. Se uma estação de tratamento de água municipal quiser purificar a água, fica difícil, porque os produtos químicos usados no fracking são um segredo comercial que as autoridades não têm permissão para saber.

Aves que mergulham nos reservatórios tóxicos morrem por causa da poluição. O cheiro destes reservatórios é muito ruim para a vizinhança, tem gente que pega câncer e outras doenças.

Quando as populações locais afetadas tentam receber compensações das companhias de petróleo, elas geralmente só conseguem alguma coisa se assinarem um compromisso de nunca falar sobre sua experiência com jornalistas e outros. Assim as empresas de petróleo tentam esconder as histórias ruins do grande público.

Quando uma grande tempestade com alaga uma área de fracking, os venenos de numerosos poços de fracking se espalham por uma área ampla, com consequências desconhecidas, como aconteceu no Arizona em setembro de 2013, quando o Estado teve a maior precipitação em 1000 anos.

O fracking pode causar terremotos

Outro perigo do fracking que as petroleiras não querem que você saiba é que ele pode causar terremotos artificiais. O fracking enfraquece as rochas subterrâneas. Isso pode provocar terremotos, e muitos pequenos tremores já foram registrados nos arredores das áreas onde a atividade de fracking é intensa.

Os movimentos de protesto contra o fracking

Em muitas localidades com fracking ou onde se planeja iniciar um fracking, a população local se reúne para protestar. O Estado de Nova Iorque tem um grande potencial de fracking. Aqui, os protestos levaram a uma proscrição temporária de qualquer fracking.

O problema é que o fracking pode poluir o rio Hudson, que atravessa a cidade de Nova Iorque, e poderia destruir as fontes de água potável de 10 milhões de pessoas. Para o povo, o custo ambiental de um grande acidente de fracking no Estado de Nova Iorque seria, por conseguinte, catastrófico. Mas as companhias petrolíferas não desistem, e continuam pressionando o governo pelo fomento do fracking.

Até agora, o fracking tem sido usado principalmente nos EUA e no Canadá, mas as empresas do petróleo querem começar na Europa. A França proibiu o fracking, e outros países têm regras rígidas, mas no norte da Inglaterra, foi iniciado o chamado fracking “exploratório”, mas aqui também há um crescente movimento contra a prática. A China precisa desesperadamente de mais energia, e possui grandes reservas de xisto no subsolo. Entretanto, os depósitos se localizam mais no árido interior do país, onde talvez seja impossível de se obter a água necessária para o fracking.

O fracking não é uma ponte para uma economia verde, mas uma ponte para o inferno

O fracking pode causar séria poluição do solo, do ar e da água, e pode até causar terremotos. Ainda assim, Obama se orgulha desta fonte de energia e fala de “gás natural de queima limpa” que reduz a quantidade de gases-estufa.

Enquanto o carvão só libera gases-estufa se for queimado, o gás natural ou metano é ele próprio um potente gás estufa. 1 kg de metano gera 100 vezes mais aquecimento global do que 1 kg de CO2. Isso significa que mesmo um pequeno vazamento de gás natural durante a extração terá um grande efeito sobre o aquecimento global.

Se apenas 3,2% do gás vazar para atmosfera durante a extração, então o consumo do gás natural produz a mesma quantidade de aquecimento global que o do carvão. A indústria diz que esse vazamento não passa de 1%, mas especialistas independentes estimam tal vazamento entre 4% e 8%, o que torna o gás de xisto ainda mais perigoso para nosso clima do que o carvão.

Obama é cauteloso em suas palavras. Ele diz: “gás natural de queima limpa”. Certamente o gás natural, durante a combustão, é mais limpo que o carvão, mas é uma HIPOCRISIA quando ele usa este argumento em favor do fracking, porque mesmo que a queima do gás seja mais limpa que a do carvão, a produção do gás de xisto gera muita poluição tóxica e a quantidade de gases estufa muito provavelmente é maior do que a da queima de carvão.

A verdade é que, além do mais, o gás natural barato, proveniente do fracking, desacelerou o desenvolvimento da energia eólica e solar nos EUA, e provavelmente em outros países, porque agora os EUA exportam mais carvão barato, por causa de sua crescente produção de gás natural para consumo próprio.

Os defensores do fracking chamam esta tecnologia de “um combustível-ponte na estrada para um futuro mais verde”, mas o fato é que o gás de xisto não é uma ponte para uma economia verde. É uma ponte para um inferno de mudança climática implacável.

O fracking não é um conto de fadas de 100 anos

Quando os céticos das mudanças climáticas ficam sem argumentos e, relutantes, têm de reconhecer que os gases-estufa de fato causam aquecimento global, eles recorrem ao argumento econômico, que é mais ou menos assim: “Não podemos parar de queimar combustíveis fósseis, porque senão nossa economia e sociedade sucumbirão”.

Os defensores do fracking fazem eco a este argumento. Sim, eles sabem que o gás natural do fracking libera uns gases-estufa, mas os EUA e o mundo precisam de combustível barato.

Alguns especialistas crêem haver petróleo e gás de xisto suficientes para abastecer os EUA por 100 anos, sem precisar recorrer à importação. Apesar do pequeno problema dos gases estufa, as empresas petrolíferas, a Agência de Proteção Ambiental dos EUA e o presidente Obama querem que fiquemos felizes e contentes com o fracking e a queda do preço do gás natural nos EUA.

Mas será mesmo um conto de fadas de 100 anos?

As empresas de combustíveis fósseis conseguem lucrar com o petróleo e o gás de xisto porque recebem inúmeras isenções fiscais do governo dos EUA, porque se beneficiaram de pesquisas feitas nas universidades com dinheiro do governo, porque pagam muito pouco pelo direito à perfuração – e quase nunca são obrigadas a pagar o verdadeiro custo do fracking. Em vez disso, as populações locais, plantas e animais ficam desamparados.

Os investimentos no fracking têm sido enormes. Os EUA têm mais de 500.000 poços de petróleo e gás. A Arábia Saudita, que produz quase a mesma quantidade, o faz com apenas 3.000 poços. Isso porque muitíssimos dos poços americanos não são muito produtivos, apesar da tão louvada e cara tecnologia do fracking com perfuração horizontal.

Esse discurso de energia para mais 100 anos é mais propaganda que realidade. Enquanto muitos poços de petróleo tradicionais podem operar por anos até começarem a declinar lentamente, um poço de fracking tem uma vida útil curta. Após três anos, um poço de fracking típico produz apenas 10% do volume inicial. Deste modo, novos poços têm que ser cavados o tempo todo, para manter-se a produção.

As companhias petrolíferas começam perfurando os sítios mais promissores. Quando estes já estão ocupados, elas se voltam para lugares menos atraentes. Isso significa que, ao longo do tempo, vai ficando mais difícil encontrar um bom local para cavar.

Em alguns dos campos de gás de xisto mais antigos, que já existem há vários anos, isso já vem acontecendo. Pode ser que todo o negócio do fracking entre em declínio daqui a apenas 10 anos, deixando os EUA e outros países com sérios problemas de poluição e grandes investimentos equivocados, que poderiam ter sido feitos para construir um futuro melhor, mas agora tornaram o futuro de todos mais incerto. 

Conclusão

Quem louva o gás de xisto extraído por fraturação hidráulica como uma solução “temporária” para o aquecimento global e as mudanças climáticas está negando o grave problema ambiental, e em particular o da liberação de gases estufa. Além disso, o gás de xisto é um investimento muito imediatista, que rende fortunas para alguns por uns poucos anos, e deixa atrás de si uma paisagem desolada.

Se todo esse dinheiro fosse investido em energia eólica e solar, nosso futuro comum seria muito mais animador.

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